Quando acordei, antes de expressar
qualquer resposta eu morri. Passaram-se anos, eu continuava ali, costas
encurvadas, olhos sem direção, lábios ainda apertados e uma gota de lagrima
ainda parada. Anos de perda, ausência resumida em vários pequenos momentos
antes do inicio da letra da canção. Uma mão segurando a testa o cotovelo sobre
a mesa e a outra apoiada pelo joelho, as extremidades ainda tremem. Anos de
solidão, resumidos em cada pedido para não me importar. Alguém esta na minha
frente. Enquanto morria, percebi o sabor da minha vida, um aroma de rejeição
subiu pela coluna adentrou ao meu paladar se misturou com a saliva e engoli, ao
passar pela garganta foi se dissipando em urina, senti um leve tremor abdominal
e um frescor frio e gelado do medo o sabor ligeiramente rápido deu lugar à impotência,
um retraimento involuntário da pélvis e um pequeno espasmo orgástico de sabor
unicamente meu. Passaram-se anos e eu estava ali, parado na minha frente, olhando
curioso para o ultimo sofrimento antes de morrer, a expressão de agonia retraída
e escondida atrás de um espasmo de esperança. Passaram-se anos e ninguém me notou,
os anos mais importantes da minha vida foram estes, todos os anos constrangidos
em um só corpo, um corpo já sem órgãos, afetado pelo vazio, sonorizado pelo
silêncio, parece que não despertou, parece que não acordou para a vida,
passaram-se anos e ninguém sentiu o cheiro, não tem ninguém lá dentro. Enrugue-me
a testa, me aperte a garganta, me abaixe a cabeça, mas não vá embora, fique me
olhando, vislumbre-se apaixone-se, ame-se, a música esta começando, já vai
cantar, afinal não tenho mais tempo pra qualquer resposta, vou esquentar a
janta!
domingo, 5 de novembro de 2017
domingo, 18 de junho de 2017
MINHA CALÇA ROXA
LIBÉLULA SENTIA INTENSAMENTE A VIDA A CADA MOMENTO! NUMA BREVE INSPIRAÇÃO, (NÃO DE DESABAFO) MAS DE IMPOSSIBILIDADE EM TRAGAR TUDO, REPRIMIA TODOS SEUS SENTIMENTOS, NÃO SE DANDO POR CONTA DA FALÊNCIA CONTINUA DOS ÓRGÃOS.
Mandíbula tremula, coração palpitante, cabelos caindo, de quando em quando um choro e assim seus dias seguiam com a notória nota de rodapé: "É só uma fase!" Em cada fase Libélula amarrava o cadarço do tênis afim de se sentir mais segura, dava passos apressados enquanto contava os dedos com os dedos, o anelar portava uma aliança daquelas que gira no dedo, e antes dos cadarços frouxarem e dos pés pararem fitava um olhar para seu anel, e com o polegar apertava-o afim de sobressair um espaço entre o dedo e a curva superior, comparava-o com sua calça roxa que lhe apertava o quadril, mas aliviava a alma. De fase em fase a vida apertava um pouco mais, para dar conta do esgarço do dia anterior, seu ar que inspirava na adolescência com facilidade preenchendo seus pulmões e aliviando a falta da mãe, agora não mais corre a partir da garganta.
As fases agora tão rotineiras já não são mais fases, se ao menos seu nome fosse outro, por que cargas d’água não se chama borboleta?
Diz a lenda que o anel da Libélula era um amuleto que em vida dava forças para ela viver, dizem até que Libélula sem o anel não aguentaria um dia na terra. Se você encontrar uma Libélula por ai apenas a aceite, observe, ela pousará em sua perna enquanto estiver sentado.
PESSOAS LIMÍTROFE PRECISAM DE AJUDA, A VIDA PODE SER SUPORTÁVEL, CUIDE-SE!
Danilo Pedrosa
segunda-feira, 10 de abril de 2017
GRATUIDADE EXISTENCIAL
Não quero
colher o que plantei, o que é meu não está guardado, não passei por momentos difíceis
e minha vida não faz sentido algum. Todos os meus dias são cotidianos, as
coisas não mudam nem pretendem. Quando a vida acabar não pretendo deixar nenhum
legado, não pretendo ser lembrado, que no meu leito de morte eu esteja apenas
morrendo, nunca me arrependerei de algo e não quero ter feito diferença na vida
de ninguém, que meus sucessores estejam viajando e nem me vejam falecer. Não
queiram entender sequer uma vírgula dessas minhas palavras, dar respostas é o
que eu menos quero. Sobre a vida; não tenho nenhuma ambição, não pretendo ter
carros, riquezas, cargos e vantagens, não quero ganhar nenhuma discussão, não
pretendo parecer mais bonito, mais evoluído e nem mais melancólico que ninguém,
não quero ir embora nem quero ficar, que a indiferença e a angustia me dominem
até causar náuseas, não pretendo amarrar o cadarço nem pentear os cabelos, não
pretendo nem cortar os cabelos.
Não pretendo viver,
mas em hipótese alguma ignorarei o amor, não ligo para a tristeza, mas nunca
esquecerei o sorriso de uma criança, não atribuo sentido algum para o dia de
hoje, porém não o esquecerei no dia de amanhã, não me ambiciono para a vida,
mas não seria capaz de ignorar projetos de engajamento, não pretendo pentear
meus cabelos, mas não os torno despenteados, que o seu crescimento seja orgânico
e gratuito, que o modo como meu cabelo cresce seja meu o meu modo fundamental
de ser no mundo, que eu não o amarre nem o solte, não o pinte nem o escove, que
ele seja gratuito assim como o vento que o torna embaraçado, que a vida seja gratuita,
que eu ame o mundo ou não, que minha única negação seja desviar o olhar, e que
eu não viva em tempos mortos, mas que tudo somando em suma quero ser algum dia
apenas alguém que diz sim.
Danilo Pedrosa
sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017
Carta de um filósofo para a humanidade
Há alguma coisa de estranho.
Alguma coisa não está certa, agora posso dizer isso com certeza. Não tenho mais
nenhuma duvida de que estão me fazendo de bobo está idéia me deixa perturbado.
Então pulo da cadeira e fico andando pela sala, sem parar, de um lado para
outro.
Eu me levanto e me sento, e me
levanto outra vez. Mudo um quadro de lugar quinze vezes por hora. Eu leio vinte
vezes a mesma e única frase. Tiro xícaras limpas do armário e as lavo para
ficarem ainda mais limpas. Eu não estou louco. Também não sou neurótico. Não é
comigo que há algo de errado. A verdade é que tem algo acontecendo pelas minhas
costas, e não tenho olhos na nuca, infelizmente, vejamos, por exemplo, a vida.
A vida tornou-se impossível para min, a vida está reservada para os idiotas.
“o que se pode nomear com
palavras pode ser dominado. Mas isso aqui é pior. Mito pior”. Agora vou entrar
na questão. Na questão, eu disse. A única questão que existe. Para que esse
pluralismo insaciável?
Realidade; como é possível
proferir essa palavra sem perder o fôlego? Quem é que sabe de onde ela vem?
Quem pode me revelar o seu endereço? No começo e no fim de todas as coisas lá
esta a pergunta: de onde vem o mundo? Eu sei que existe uma resposta para essa
pergunta, no entanto está fora do meu alcance. Posso me conformar com isso?
Como posso me conformar e levar a minha vida num mundo sem saber de onde ele
vem?
Deus você disse. Sim, foi isso.
Agora chamou por ele. Só que ele não se deu sequer o trabalho de deixar um
simples cartão de visitas. Não há um monólito num lugar ermo e afastado no qual
ele tenha assinado sua obra? Mas ele existe mesmo? E o mundo como é que fica?
Afinal é dele que estamos falando aqui. Por hora pensamos apenas nele. De onde
vem esse colosso?
Naturalmente podemos imaginar um
mundo que sempre tenha existido. Mas a questão é: é possível que um mundo
sempre tenha existido? Ele não precisa ter surgido num determinado momento? Uma
outra idéia razoável é que Deus criou o mundo e que Deus sempre existiu.
Resolvido. Ponto final. Essa também é uma idéia evidente, desta forma não
estamos avançando apenas se esquivando do problema. Evidentemente podemos nos
esquivar indefinidamente do problema. Mas seja como for, uma coisa é certa: em
algum momento, alguma coisa deve ter surgido do nada.
O mundo é uma contínua
provocação, meu caro, problemas familiares! Só os macacos têm. Quanto a min,
tento ser humano.
De onde vem o mundo, perguntei. E
repito: de onde diabos vem o mundo? Setecentas vezes por dia me faço essa
pergunta eu sei que posso tirar o cavalo da chuva. Com rigor sistemático,
gostaria de investigar a realidade mais a fundo e encontrar uma explicação,
embora eu esteja no meio dessa investigação como investigado. Eu me soltei da
terra e estou flutuando no espaço vazio. Aqui é tão solitário, senhoras e
senhores! Antigamente era raro eu ter esses pensamentos. Uma pedra, uma
paisagem, m bicho podiam provoca-los. Depois esses pensamentos começaram a me
assaltar regularmente, ao acordar de manhã. Pouco a pouco, o mundo foi ficando
mais claro. Seus contornos foram se desenhando de forma mais nítida. Agora
penso nisso com intervalos de minutos. Mas é esse pensar que me atormenta, por
que não me leva a absolutamente nada. O complicado é que justamente isso me
revolta. Eu sou uma parte do circulo do qual gostaria de cair fora. Só terei
paz quando decifrar o mistério. Já mencionei como a linguagem me falha. Falo a
mesma língua das pessoas ao meu redor, nós usamos as mesmas palavra. Embora eu
combine essas palavras de forma
agradável não cai a ficha. O problema não é verbal, mas cognitivo. Elas não
compreendem a verdade que por detrás das minhas palavras.
Metade da minha vida eu me
dediquei à tentativa de despertar entendimento. Embora meu maior desejo fosse
conscientizar meus semelhantes de que eles existem, sou considerado um
histérico.
- Existe um mundo eu disse a ele.
-
Imagine só: nos existimos!
-
O mundo é aqui e agora.
Chamo a sua atenção para algo
que, segundo meus critérios, deveria abala-lo nas suas mais profundas
convicções, mas ele apenas abana a cabeça e prossegue apressadamente. Ele me
tacha de louco. Para que ele próprio não enlouqueça, convence a si mesmo de que
alguma coisa está errada comigo. É de se admirar que eu fique desesperado,
quando vejo meus semelhantes por aí, impassíveis como um rebanho de vacas
pastando. Eles de ajeitam de uma certa forma. Eu tenho vertigens quando penso em ser. Por min, ele pode
ser como quiser. Por mim, fantasmas, unicórnios e elefantes cor-de-rosa podem
passear na rua, isso não me perturba. Só o fato de o mundo existir já foram
ultrapassadas as fronteiras do improvável. Por que um elefante precisa ser
cor-de-rosa para ser considerado notável? Por que ele precisa ter duas cabeças
para merecer uma noticia no jornal? Como é possível que o mundo não concorde
comigo quando afirmo que é louco estar aqui?
Não tenho mais nada a dizer
acredito ter exposto suficientemente o meu ponto de vista. Não leva a nada sair
por aí e gritar até a rouquidão que a vida é breve. Do mesmo modo, poderíamos
beliscar um porco e contar-lhe que ele vai ser abatido daqui a pouco. Talvez
ele se levante os olhos por um instante, dois olhos vazios e inexpressivos.
Com grande vivacidade, eles se
lançam pelo mundo e existem, perambulam por aí num globo terrestre no universo
como personagens de carne é osso saídas de um conto de fadas. Mas não estão
acordados de verdade. Eles dormem o sono da vida burguesa no castelo da bela
adormecida.
Embora aqui sejam hospedes apenas
por um curto prazo. Eles precisam estar quase mortos para finalmente
descobrirem a si mesmos.
Retirado de: O Mundo de Sofia - J.G
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