segunda-feira, 10 de abril de 2017

GRATUIDADE EXISTENCIAL


Não quero colher o que plantei, o que é meu não está guardado, não passei por momentos difíceis e minha vida não faz sentido algum. Todos os meus dias são cotidianos, as coisas não mudam nem pretendem. Quando a vida acabar não pretendo deixar nenhum legado, não pretendo ser lembrado, que no meu leito de morte eu esteja apenas morrendo, nunca me arrependerei de algo e não quero ter feito diferença na vida de ninguém, que meus sucessores estejam viajando e nem me vejam falecer. Não queiram entender sequer uma vírgula dessas minhas palavras, dar respostas é o que eu menos quero. Sobre a vida; não tenho nenhuma ambição, não pretendo ter carros, riquezas, cargos e vantagens, não quero ganhar nenhuma discussão, não pretendo parecer mais bonito, mais evoluído e nem mais melancólico que ninguém, não quero ir embora nem quero ficar, que a indiferença e a angustia me dominem até causar náuseas, não pretendo amarrar o cadarço nem pentear os cabelos, não pretendo nem cortar os cabelos.
Não pretendo viver, mas em hipótese alguma ignorarei o amor, não ligo para a tristeza, mas nunca esquecerei o sorriso de uma criança, não atribuo sentido algum para o dia de hoje, porém não o esquecerei no dia de amanhã, não me ambiciono para a vida, mas não seria capaz de ignorar projetos de engajamento, não pretendo pentear meus cabelos, mas não os torno despenteados, que o seu crescimento seja orgânico e gratuito, que o modo como meu cabelo cresce seja meu o meu modo fundamental de ser no mundo, que eu não o amarre nem o solte, não o pinte nem o escove, que ele seja gratuito assim como o vento que o torna embaraçado, que a vida seja gratuita, que eu ame o mundo ou não, que minha única negação seja desviar o olhar, e que eu não viva em tempos mortos, mas que tudo somando em suma quero ser algum dia apenas alguém que diz sim.


Danilo Pedrosa